É necessário arquivar cupom fiscal para fins de dedução de despesas?

burocracia, excesso de documentos, papeisPode-se afirmar de maneira incontestável que é dado às empresas que escolheram fazer a tributação pelo Lucro Real, fazer a dedução de algumas despesas, dentro dos conceitos definidos pela legislação do Imposto de Renda. No entanto, uma questão importante sobre o tema seria definir quais são os meios de prova que suportaria em esse procedimento. Quando estamos diante de despesas baseadas em notas fiscais, a questão é mais simples em virtude do conhecimento, sistema de arquivo e, principalmente, de prova eletrônica. Mas e quanto às despesas não oriundas de operações com notas fiscais e sim com cupons fiscais?

Seria possível não arquivar cupons fiscais? Seria possível não depender de cupom fiscal para comprovar a realização da despesa e, consequentemente, mesmo sem tal documento, praticar a dedução do imposto de renda?

Entendemos que sim. Seria possível deduzir a despesa sem ter o cupom fiscal se o valor envolvido for pequeno.

Todavia, é oportuno ressaltar que o cupom fiscal é útil e, até mais eficaz, para demonstrar a despesa e, consequentemente, afastar problemas perante a Receita Federal.

Ora, conforme mencionamos, as despesas efetuadas pelas pessoas jurídicas podem ser dedutíveis ou indedutíveis da apuração do imposto de renda.

As despesas operacionais dedutíveis são aquelas que se encaixam nas condições fixadas no artigo 229 do Regulamento do Imposto de Renda, isto é, despesas necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora de receitas. As despesas necessárias são as despesas pagas ou incorridas e que sejam usuais e normais no tipo de transações, operações ou atividade da empresa.

Os cupons fiscais podem ser utilizados como comprovantes de despesas para fins de dedução de imposto de renda. O desafio que colocamos, em nome da economia de procedimentos internos dentro das empresas, seria no sentido de confirmar a possibilidade de comprovar despesas sem a existência do cupom fiscal.

Decisões de processo administrativo mencionam que “comprovando a pessoa jurídica que o gasto existiu e se trata de despesa normal e usual no tipo de transações, operações ou atividades da empresa, por qualquer meio de prova lícito, inclusive notas fiscais e tickets de caixa, admite-se a dedutibilidade” (Ac. 105-06.786/92, publicado em 09.10.1996).

Com isso, pode-se concluir que os cupons de pequenos valores são desnecessários? Não exatamente. É fato que numa eventual fiscalização da Receita Federal pode ser exigido um comprovante das despesas realizadas e, nesse sentido, os cupons fiscais seriam a forma mais prática de fazer a prova.

Se eventualmente a empresa for autuada por ausência de prova fundada em cupom fiscal, seria possível alegar que despesas de pequeno valor podem ser comprovadas de forma indireta quando demonstradas as despesas de grande valor.

Ou seja, segundo decisões proferidas em processos administrativos, a comprovação de despesas pode ser feita por meio de um conjunto de provas que resulte evidente a necessidade da aquisição de bens ou serviços para a manutenção da fonte produtora dos rendimentos. Isso significa que despesas de pequeno valor e difícil comprovação poderiam ser tidas como acessórias ante a razoabilidade da comprovação das principais.

No mesmo sentido de entendimento podemos trazer ao texto a luz da ilustre mestre Maria Rita Ferragut (1):

“Toda verdade deve resistir à refutação. A prova, e preferencialmente, a contraposição de provas, visa demonstrar a verdade ou a falsidade do significado de um enunciado. Por contraposição entende-se a comparação do dado que se quer provar com outros que confirmem ou infirmem sua exatidão. A prova resultará da confirmação ou da concordância dos dados confrontados.”

Por outro lado, de acordo com a orientação contida no Parecer Normativo CST nº 10 de 1976, a comprovação de despesas e receitas, qualquer que seja a sua natureza, há de ser feita com os documentos de praxe, isto é, notas fiscais, conhecimentos, contratos, recibos, etc., desde que a lei (estadual ou municipal) não imponha forma especial.

Assim, de acordo com o referido Parecer, na hipótese de tais entes não determinarem através da legislação a obrigatoriedade de emitir um documento específico, serão aceitos pela Receita Federal do Brasil documento de idoneidade indiscutível, tais como recibo, nota fiscal etc., desde que sejam de idoneidade indiscutível.

Dispõe ainda oartigo 82 da Lei nº 9.430 de 1996que, além das demais hipóteses de inidoneidade de documentos previstos na legislação, não produzirá efeitos tributários em favor de terceiros interessados o documento emitido por pessoa jurídica cuja inscrição no CNPJ tenha sido considerada ou declarada inapta.

De acordo com o Parecer Normativo CST nº 10 de 1976 as despesas da empresa são aquelas consideradas como necessárias às suas atividades e à manutenção da respectiva fonte produtora.

Segundo referido Parecer pode ocorrer, todavia, o fato de a despesa ser de pequeno valor e, ocasionalmente, de difícil comprovação. Nesse caso, essa despesa poderá ser tida como acessória, admissível ante a razoabilidade e comprovação das principais, a juízo da autoridade fiscal.

Segue abaixo respostas da Receita Federal para ilustrar.

Processo de Consulta nº 283/00

Órgão: Superintendência Regional da Receita Federal – SRRF / 6a. Região Fiscal

Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ

Ementa: SOCIEDADE “DE FATO”.

É contribuinte do imposto de renda da pessoa jurídica, sujeita a todos os encargos impostos à pessoa jurídica, a sociedade “de fato” formada por co-proprietários de veículo que se dedicam à exploração conjunta de serviço de transporte de carga.

LUCRO REAL. COMPROVAÇÃO DE DESPESAS DEDUTÍVEIS. As pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real podem comprovar a realização de despesas dedutíveis por qualquer documentação hábil e idônea (fatura, nota fiscal, recibo etc.) desde que fique claramente demonstrada a natureza da despesa, a identidade do beneficiário, a quantidade, o valor da operação, etc.

DISPOSITIVOS LEGAIS: Art.47,146e299e §§ doRIR/1999;Parecer Normativo CST nº 32/81.

FRANCISCO PAWLOW – Chefe

(Data da Decisão: 24.11.2000 01.03.2001) – 513547

Órgão: Superintendência

Regional da Receita Federal –

SRRF/6ª Região Fiscal

Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ

Ementa: COMPROVAÇÃO DE DESPESAS

As despesas operacionais devem ser comprovadas com documentação hábil. Se porventura o contribuinte não possuir comprovantes hábeis das despesas escrituradas, deverá acrescentar esses dispêndios no lucro real para efeito de tributação. A identificação do comprador, com menção de seu CPF ou CNPJ, a descrição de bens ou serviços objeto da operação (ainda que resumida ou por códigos), a data e o valor da operação são elementos indispensáveis do cupom fiscal, para fins de comprovação de despesas.

DISPOSITIVOS LEGAIS:Lei nº 9.532/1997, art. 61;

Convênio ECF nº 1/1998;RIR/1999, arts.299e923;

Parecer Normativo nº 83/1976.

FRANCISCO PAWLOW – Chefe

(Data da Decisão: 18.07.2001 17.10.2001) – 607140

Órgão: Superintendência

Regional da Receita Federal – SRRF/ 8ª Região Fiscal

Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ

Ementa: As despesas de viagens de diretores ou sócios gerentes são dedutíveis como custo ou despesa operacional desde que razoáveis, comprovadas com documentação hábil e intrinsecamente ligadas à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora.

Dispositivos Legais:RIR/1999, arts.299,302e923.

VICTOR HUGO ISOLDI DE MELLO CASTANHO – Chefe

(Data da Decisão: 14.09.2001 24.10.2001) – 607225

Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47).

§ 1º São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 1º).

§ 2º As despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de transações, operações ou atividades da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 2º).

§ 3º O disposto neste artigo aplica-se também às gratificações pagas aos empregados, seja qual for a designação que tiverem.

Portanto, não negamos que inclusive com relação às despesas pequenas a ausência de cupons pode causar questionamentos da Receita Federal e até, dependendo do auditor-fiscal, originar inclusive autuação. Todavia, existem boas chances de defesa se demonstrado que o conjunto de outras provas pode demonstrar a existência das despesas. Portanto, seria um risco possível de ser assumido nas hipóteses em que arquivar cupom fiscal seja muito oneroso em termos de procedimentos internos.

Isto porque se por um lado é possível não utilizar cupons de pequeno valor, o que pode não agradar o Fisco e significaria mais trabalho para comprovar a despesa no caso de fiscalização, por outro lado guardar todos os comprovantes também é muito difícil. Consequentemente, pode-se adotar a prática de guardar o máximo de cupons possível para facilitar a comprovação da despesa, uma vez não existindo partir para outro tipo de prova que englobe indiretamente as atividades que a princípio seriam demonstradas por cupom fiscal.

Nota

Presunções no Direito Tributário. São Paulo, Dialética, 2001, pág.

 

Ricardo Piza Di Giovanni
Advogado especialista em Direito Tributário.

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