Limitações legais sobre o banco de horas

O banco de horas tem regras importantes a serem seguidas, afim de que a empresa não tenha problemas com a justiça trabalhista.

Por este motivo, convidamos um especialista para falar sobre as limitações legais dessa prática de trabalho. Continue lendo para tirar suas dúvidas!

Aspectos legais do banco de horas

Apesar de haver previsão constitucional para a compensação de horários em nossa Constituição Federal (art. 7°, XIII), o instituto do Banco de Horas ganhou maior relevância com a edição da Lei n° 9.601/1998, a qual realizou, diversas alterações no Decreto-Lei n° 5.452/1943 (Consolidação das Leis do Trabalho – CLT), dentre elas, a dispensa de acréscimo de salário em caso de excesso de horas trabalhadas.

Em seu nascimento, o art. 59 da CLT previu que ”poderá ser dispensado o acréscimo de salário se, por força de acordo ou convenção coletiva de trabalho, o excesso de horas em um dia for compensado pela correspondente diminuição em outro dia (…)” .

Notem que a regra permitia sua implantação apenas por meio de previsão de seu funcionamento em Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho (ACT ou CCT).

Em sequência, a Medida Provisória n° 2.164-41/2001, manteve tal obrigatoriedade, mas aumentou o período máximo de utilização do Banco de Horas, passando de cento e vinte dias para um ano.

Com a Reforma Trabalhista – Lei n° 13.467/2017 -, e vigorando até a data de edição desse texto, o prazo do Banco de Horas foi mantido um ano (art. 59, parágrafo segundo, CLT). Contudo, flexibilizou-se a permissão de seu uso por meio de Acordo Individual de Trabalho, mas limitado a seis meses (art. 59, parágrafo quinto, CLT).

Em acréscimo a tais dispositivos, é importante destacar a existência da Súmula 85, do Tribunal Superior do Trabalho – TST, que dispõe sobre o tema e acrescenta demais informações sobre a utilização do Banco de Horas.

Por fim, tendo em vista se tratar de legislação recente, em decorrência da pandemia do vírus COVID-19, vale citar, ao final do texto, a edição da Medida Provisória n° 927, de 22 de março de 2020 e suas aplicações especiais sobre o instituto do Banco de Horas.

Superada esta parte legal, serão destacados o regime disposto pela CLT e decisões judiciais recentes em primeiro lugar e, ao final, as diferenças trazidas pelas regras, a princípio transitórias, da MP n° 927/2020, para fins de definição e limitações legais do Banco de Horas.

O que é e como funciona o banco de horas?

Como o próprio nome apresenta, o Banco de Horas é uma forma de compensar, não apenas as horas excedidas, mas as que não foram alcançadas para o cumprimento da jornada de trabalho avençada.

Em vista disso, o ponto focal é o saldo de horas trabalhadas durante um determinado período. Isto é, se houve excesso de dedicação por parte do trabalhador ou se o mesmo não cumpriu adequadamente sua jornada.

Para fins de melhor compreensão, a título exemplificativo, deve-se dividir as situações em duas hipóteses:

·Jornada: 8 horas (8:00 às 17:00, com uma hora de intervalo).

a)  Hipótese 1: trabalhou de 8:00 às 18:00 –> 1 hora de crédito.

Como destacado, em havendo Banco de Horas no caso em apreço, não há que se falar em pagamentos de horas extras, desde que tal crédito possa ser compensado em um outro dia, conforme acordado em Acordo Individual (em até 6 meses) ou em Acordo ou Convenção Coletiva (até um ano).

b)  Hipótese 2: laborou de 9:00 às 17:00 -> 1 hora de débito.

Já na hipótese 2, quando há débito, ou o denominado banco de horas negativo, tal fato não é contemplado na CLT e, por este motivo merece atenção.

Enquanto o saldo positivo é meramente constatado pelo excedente trabalhado, o negativo requer uma análise do motivo da falta, atraso ou saída antes do expediente, sob pena da dedução se tornar uma conduta ilegal do empregador.

A título ilustrativo, vale a pena trazer o exemplo constante em decisão do TST (AIRR – 1002502-33.2015.5.02.0471), que considerou ilegal o desconto no Banco de Horas de empregado que foi obrigado à repouso forçado, uma vez que a empresa estava com baixa produtividade. Situação em que o empregador deveria dar férias coletivas.

Por outro lado, em outra ocasião analisada pelo TST (AIRR – 1828-76.2016.5.12.0045), foi permitido à empresa reaver valores referentes a saldo negativo no Banco de Horas quando realizada a dispensa do funcionário, pois este saía mais cedo às sextas-feiras para estudar e depois não fazia a reposição adequada do tempo utilizado em seu benefício.

Com tais exemplos, como regra geral, apura-se que a utilização do Banco de Horas deve refletir a exata compensação do tempo disponibilizado para cumprimento regular da jornada, dentro dos parâmetros acordados e sem ocorrência de situações de benefício próprio que prejudicam a outra parte.

Para isso, torna-se necessário que o sistema adotado seja confiável, dentro dos parâmetros legais e que apresente todas as informações necessárias para acompanhamento da compensação das horas efetivamente trabalhadas, sob pena de ser considerado nulo.

Diante disso, quais parâmetros a lei e a jurisprudência estabelecem para o uso do Banco de Horas?

Quais sãos os limites para o uso do banco de horas?

a)Limite na jornada

Segundo se extrai do art. 59 da CLT, a regra, para quando se extrapola o limite máximo da jornada de trabalho fixada, é o pagamento de, no máximo, duas horas extras por dia, conforme convencionado.

Como exceção, o parágrafo segundo do mencionado artigo apresenta a possibilidade de uso de Banco de Horas, desde que:

– não seja ultrapassado o limite de dez horas diárias; e

– não exceda a soma das jornadas semanais de trabalho previstas.

Em tais limites colocados no Banco de Horas, deve-se ter cuidado para a desnaturação de flexibilidade que o próprio instituto propõe.

A Súmula 85 do TST, em seu inciso IV, determina que, ainda que a CLT permita o limite de dez horas diárias, isso não poderá ser habitual ao ponto de quebrar o acordo firmado entre as partes, pois deve-se respeitar o limite de quarenta e quatro horas totais, sob pena de pagar hora extra no que exceder este teto.

A título exemplificativo:

  • Jornada regular – segunda à sábado: 44 horas semanais (8 horas seg. à sex e 4 horas no sábado).
  • Controle/Limite de compensação: mensal.
  • Horas trabalhadas durante a semana: 54 horas (10 horas de segunda à sexta e 4 horas no sábado).
  • Horas trabalhadas no mês (5 semanas): 270 horas (54×5).
  • Limite acordado da soma das horas semanais: 220 horas (44×5).
  •  Excedente na jornada semanal: 50 horas extraordinárias devidas.

Note que a regra do limite diário foi respeitada, mas o limite de horas semanais trabalhadas (270h) excedeu o teto (220h) convencionado entre as partes.

Por tal razão, o excedente ao referencial semanal (50h) passa a ser considerado como hora extraordinária, pois, apesar de respeitar o limite de horas diárias, houve quebra do acordo por ultrapassar o máximo da soma das jornadas semanais durante o período convencionado (mês).

Ainda nesse enfoque, cabe acrescentar que tais limites não são absolutos, uma vez que há possibilidade de aumento da carga de trabalho nos seguintes casos:

– art. 61 – por necessidade imperiosa, força maior (dispensa de pagamento de horas extras) ou conclusão de serviços inadiáveis (Pagamento mínimo de 25% a mais pela hora trabalhada, limitado à 12 horas);

–  art. 62 – empregados externos que seja incompatível com a fixação de horário de trabalho / gerentes, quando o salário do cargo de confiança for igual ou superior a 40% de seu salário / empregados em regime de teletrabalho.

Contudo, tais exceções deverão ser muito bem justificadas (força maior e compromissos inadiáveis), bem como a alegação de falta de poder para controle da jornada de trabalho do empregado não tem sido bem aceita pelos tribunais, dado o avanço de tecnologias, como o TANGERINO, que permitem a marcação de ponto em diversas situações.

Há ainda a possibilidade de jornada que superam as regras destacadas aqui, como é o caso do regime 12×36. Porém, este será melhor explicitado em nosso blog, com o texto “Escala 12×36: como gerir as jornadas nesse modelo?”

b)Limite temporal

Como destacado acima, o art. 59, CLT, destaca que o Banco de Horas, quando autorizado por meio de Acordo Coletivo de Trabalho – ACT ou Convenção Coletiva de Trabalho – CCT, poderá ter um prazo de até um ano para que as horas possam ser compensadas. 

Com a Reforma Trabalhista, o parágrafo quinto do citado art. 59 autoriza o estabelecimento do Banco de Horas por meio de Acordo Individual de Trabalho – AIT. Contudo, a limitação para a compensação será de até seis meses, quando por escrito.

Nota-se, portanto, que o legislador flexibilizou apenas o limite máximo para compensação. O que não retira poder dos sindicatos na proteção dos direitos do trabalhador, pois não se verifica impeditivo, por exemplo, de uma CCT ou ACT impor um limite de um mês para reequilíbrio das horas trabalhadas para uma categoria. 

Neste ponto, o empregador deve atentar para o disposto na Súmula 85 do TST, especificamente em seu inciso II, o qual destaca que “o acordo individual para compensação de horas é válido, salvo se houver norma coletiva em sentido contrário”.

Assim, antes de firmar um AIT, é recomendável verificar se há existência de norma coletiva que possa ser afrontada com tal acordo individual.

Por fim, cumpre dizer que o Legislador verificou a possibilidade de acordos individuais tácitos (não escritos)

c)Limite para compensação

Segundo se observa na CLT e o destacado acima, extrai-se que a limitação para compensação das horas trabalhadas em excesso serão:

 – Até seis meses – quando for firmado por Acordo Individual, por escrito, de Trabalho; e

– Até um ano – quando for firmado por meio de norma coletiva (ACT ou CCT).

E em caso de rescisão?

Conforme destacado acima, a limitação para a compensação do banco de horas varia de acordo com o avençado entre as partes ou estabelecido em norma coletiva.

Contudo, tal tratativa pode ser quebrada no meio do caminho por meio de uma rescisão do contrato de trabalho realizada pelo empregador ou pelo próprio empregado.

No primeiro caso, se o trabalhador figurar como credor no Banco de Horas (crédito), este “terá direito ao pagamento das horas extras não compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da rescisão”, conforme prevê o art. 59, parágrafo terceiro, CLT.

Nesse ponto, cabe alertar que a CLT não atribui responsabilidade a ninguém pela rescisão. Isto é, independente de quem rescinda, tais horas extras serão devidas.

Por outro lado, tendo em vista que a CLT é omissa, e se o empregado estiver com banco de horas negativo, ou seja, devedor de horas de trabalho?

Como já destacado acima, o TST já estabeleceu a possibilidade do empregador deduzir os valores correspondentes ao saldo negativo do empregado no Banco de Horas. Contudo, a situação é analisada caso a caso.  

E no sábado, domingo e feriados?

Para analisar esta situação, deve-se ter em mente se tais dias são considerados dias efetivos de trabalho na respectiva empresa ou se são considerados dias de descanso. Tal informação deverá constar no acordo estabelecido entre as partes.

Caso seja considerado um dia de repouso, eventuais horas trabalhadas nesses dias serão consideradas extras, na proporção especificada em norma coletiva ou na Lei.

Tal entendimento restou consolidado em decisão do TST (RR-1578-30.2016.5.12.0017), a qual cita a Súmula 85 do citado Tribunal, quando apurou labor habitual nos sábados, em desacordo com o acordo estabelecido entre as partes.

Responsabilidade no controle da jornada em banco de horas

A responsabilidade pelo controle de horas de jornada é do empregador, conforme destaca a Súmula 338 do TST.

Diante disso, tal controle deverá retratar fielmente a duração da jornada do empregado, devendo serem claros todos os saldos a serem creditados ou deduzidos, horas a mais ou a menos trabalhadas, sob pena do Banco de Horas ser considerado ilegal.

Quando em juízo, eventual contestação do apurado deverá ser comprovada pelo empregado por meio de provas, sob pena do registro efetuado ser considerado válido. 

Medida provisória 927/2020

A MP 927/2020 foi editada pelo Governo Federal em razão da pandemia do vírus COVID-19, ou também denominado novo Coronavírus.

Em tal regramento, diversas regras trabalhistas foram flexibilizadas, de modo a dar mais celeridade na adoção de determinados procedimentos, postergação de determinados pagamentos e ampliação de prazos.

No caso do Banco de Horas, verificam-se as seguintes diferenças do modelo estabelecido até esses dias:

– Compensação da jornada, por meio Acordo Coletivo de Trabalho ou Acordo Individual de Trabalho com prazo de compensação de até 18 meses a contar da data de encerramento do estado de calamidade pública;

– Menção apenas do limite diário de 10 horas de trabalho; e

– A compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador independente de convenção coletiva ou acordo individual de trabalho.

Diante de tais regras, torna-se possível verificar um aumento na autonomia do empregador para fins de definição de regras para o Banco de Horas, bem como um aumento no prazo para compensação das horas.

Como ainda é recente, torna-se prudente interpretar este regime como algo a parte, extraordinário e provisório. Hipótese que deve ser implantada com cautela na empresa e apenas em casos bem fundamentados.

 



Conteúdo original Tangerino

 

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